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terça-feira, 18 de março de 2014

"EXISTE UM APARTHEID EDUCACIONAL NO BRASIL"


Leonardo França espreita pela janela do seu apartamento, na zona norte de São Paulo. Já atravessámos a cidade e chegámos uns minutos depois das 6h, a hora combinada. Sai de cabelo molhado e mochila às costas, andar acelerado.
O autocarro sobe e desce os morros em direcção a uma zona ainda mais a Norte, na periferia. À volta, os prédios altos do centro "encolheram" - vêem-se construções precárias, lixo nas ruas, casas com tijolo à mostra. Ainda é de noite e irá continuar a ser por mais algum tempo. A vantagem é que os autocarros ainda não se encheram de gente.
Iremos demorar uma hora, apanhar dois autocarros, até à escola onde ele dá aulas a estudantes do equivalente ao 2.º e 3.º ciclo português. A campainha de entrada toca bem cedo, às 7h. "As crianças sentem isso no corpo, não conseguem chegar às 7h e ficar logo dispostas a estar na aula. Então as primeiras aulas são mais tranquilas porque eles estão mais calmos, sonolentos, a acordar."
Por causa do Mundial de Futebol em Junho, as escolas do ensino estadual anteciparam o ano lectivo e, a 27 de Janeiro, Leonardo deu a primeira aula do ano na Escola pública Professora Eunice Terezinha de Oliveira Frágoas.
Por esta altura, as férias de Verão no Brasil já acabaram. No ano passado, Leonardo ensinava Artes Visuais em duas escolas — dois dias numa, três dias noutra. Nada de invulgar para quem está a começar a carreira, e precisa de uma semana de trabalho completa para engordar o salário ao fim do mês. O ordenado médio mensal de um professor como ele no Brasil não chega aos 600 euros.
Saímos do primeiro autocarro, andamos até outra paragem - uma estaca azul, sem indicação das carreiras que ali passam. Caminhamos depois mais uns 10 minutos até à escola. 
As crianças entram por um portão que se fecha, alto, sem visibilidade para o interior; e Leonardo entra por outra porta. Desaparece, não podemos entrar. Por enquanto, a sua carga horária é das 7h às 12h20, num total que calcula ser de 28 horas no período da manhã, de 2ª a 6ª feira. Leonardo dá aulas a crianças de 10 a 15 anos, num total de 14 turmas.
Mesmo ao lado da escola passa uma espécie de rio-esgoto a céu aberto. O casario, muito dele feito com tijolo à vista, sobe pelo morro. Há um prédio alto que se destaca ao longe, o resto é construção precária e baixa como a que fomos atravessando pelo caminho. Não vemos semáforos em frente à escola, não vemos lombas para fazer abrandar os carros quando os meninos saírem.
"Se for prestar atenção na arquitectura de uma escola pública hoje não há nada mais parecido do que um presídio", analisava Leonardo no caminho. "A escola pública estadual tem uma arquitectura prisional, foi o primeiro choque quando entrei: a quantidade de grades, de câmaras de segurança, de buracos por onde passar, de cadeados em todos os lugares, de guichets que são isolados, de salas protegidas... Os alunos sentem no corpo essa opressão, essa falta de autonomia e de liberdade.
Na escola particular, quando você entra é um outro ambiente, quase empresarial, limpo; é a protecção do mundo lá fora - protege aquelas crianças de classes sociais mais abastadas da violência, da insegurança que está na rua, que está na cidade. Então é um ambiente agradável, confortável. Acho isso preocupante, é uma coisa esteticamente planeada, para criar uma bolha."
Desafios concretos aqui onde dá aulas: falta de condições para trabalhar com os alunos, num espaço adequado, numa área - as artes - em que precisa de material e não tem; não há informação sobre as necessidades dos alunos e das turmas porque "a maioria dos professores são novos"; o planejamento para o ano "só é feito daqui a dois meses".
"As salas estão superlotadas. No início do ano não há tantos alunos, estão voltando de férias, mas dentro em pouco vai ter 40-45-50 alunos numa sala." Nesta escola, as crianças são sobretudo da periferia, "bem carentes". A maioria tem "uma estrutura familiar conturbada", muitos não têm pai ou o pai não está presente. "E a gente percebe logo de início que as crianças acabam por ter uma proximidade com o professor homem e vai e falam: 'Pode ser meu pai? Posso ser seu filho?'"
Violência é com o aluno

Licenciado em Artes Cénicas, Leonardo começou por ensinar em escolas privadas. Mudou para o ensino público no ano passado - é neste momento professor temporário. Como se candidatou a efectivo, pode acontecer ter de abandonar a escola onde está para assumir o cargo noutra, bem a meio do ano lectivo. Posiciona-se de um lado da linha que divide o país em dois. "Na verdade, existe um apartheid educacional no Brasil: quem pode pagar tem educação, tem acesso a conhecimento, a informação, a tecnologias novas; e, quem não tem, fica à mercê dessa escola." Depois há a relação directa com os alunos. "O aluno da escola privada sente-se em casa na escola. Sente-se confortável com o professor." Socialmente, estará de igual para igual, por vezes até em posição de vantagem. Já na escola pública, a primeira impressão que Leonardo sentiu foi que "ia ser atacado", "muito pela mitologia que se criou".
Viu "alunos que têm um porte físico de adultos" e "uma mentalidade de adultos", "quando eles querem ferir eles sabem". "Então fui todo 'armado'. E quando entrei armado eles ficaram armados. Fui mudando a minha postura."
E foi reflectindo: critica-se a forma como o ambiente na escola pública "é violento", "mas ninguém para para pensar o quanto a escola é violenta com o aluno", diz. "Acho que a maior violência que se pode falar hoje no Brasil é a escola pública, que é uma violência contra o aluno - no seu formato, no seu modo arcaico de ser modelo de educação, de fazer o aluno ficar das 7h ao meio-dia dentro de uma sala de aula, quente, sem ventilação, com outros 40 ou 50 alunos, ouvindo o professor falar, sem se poder levantar... E aí dá para entender um pouco melhor a revolta que eles sentem contra o próprio espaço."
Se lhe perguntassem, ele diria que vive num bairro de classe média. Nem sempre foi assim. Cresceu na periferia de Guarulhos, no Estado de São Paulo, filho de professora e de pai desempregado. De volta a casa dele, já depois de dar aulas, conta-nos que teve um professor de artes que o inspirou. O apartamento fica na cave, mas as janelas a todo o comprimento do rectângulo que é a sala fazem entrar muita luz. As estantes enchem-se com livros, muitos de arte, há pincéis, há desenhos, um computador, fotografias da família.
Entre os 14 e os 18 anos, Leonardo trabalhou numa fábrica metalúrgica. "Acordava às 5h, entrava às 7h, saía ao meio dia. Depois ia estudar mecânica numa escola técnica e depois ainda ia para o ensino médio [secundário] numa escola pública - durante três, quatro anos fiz isso. A qualidade de vida só veio a mudar mais recentemente, na universidade. Fui começando a trabalhar noutras coisas" - como o teatro. É apaixonado pela profissão, apesar de, na escola de artes, quem segue a via pedagógica ser olhado de lado, como se fosse "uma artista frustrado", lamenta. "Quando entrei, percebi a dificuldade e as pequenas satisfações - que é quando você vê o aluno por si próprio seguindo um caminho, exercendo uma pesquisa, se interessando por coisas que antes não se interessava."
No ano passado, com um grupo de cerca de 15 professores jovens, Leonardo participou num projecto em que fizeram um simpósio de Filosofia com temas escolhidos pelos alunos, primeiro no próprio liceu, escola pública na periferia (Escola Estadual Pedro Alexandrino), depois numa universidade. Descobriu que alguns alunos eram poetas, outros músicos. Fala disso com emoção.
À tarde, quatro desses professores juntam-se à conversa. Chegam e sentam-se com à-vontade de quem conhece a casa, falam com entusiasmo da experiência, criticam o ensino. Juntaram-se em grupo de trabalho por iniciativa própria, fizeram várias horas extraordinárias, tudo pro bono. Wládmir Gonçalves, 31 anos, professor de Português, descreve um sistema onde "o aluno é obrigado a passar de ano" - ao abrigo da progressão continuada, o aluno não reprova. Por isso, teve alunos do 2º e 3º ciclos português que "eram analfabetos", e alunos do ensino secundário "que são analfabetos funcionais" (sem capacidade de interpretação).
Há alunos que nem sequer conseguem localizar geograficamente a zona onde moram, sublinha. "Já tive alunos do [8º ano] que não sabiam escrever o próprio nome...". Ele, que cresceu numa favela - e só é classe baixa pela zona onde mora, porque a casa tem quatro quartos, garagem, a mãe tem um carro caro, etc, diz -, desdobra-se em aulas para ganhar mais uns trocos. Com salas onde estão 50 alunos, e aulas de 50 minutos, fica com um 1 minuto para cada aluno, calcula. "Como é que consigo construir alguma coisa?"
Recentemente, a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) divulgou um relatório onde o Brasil aparecia como o oitavo país com maior índice de analfabetismo num ranking de 150 países (cerca de 13 milhões). O número de analfabetos funcionais também é alto: 27%  em 2011, segundo o Observatório do Plano Nacional da Educação (PNE). Em São Paulo, o estado mais rico do Brasil, está a maior rede de ensino.
E os profissionais do ensino são o terceiro grupo ocupacional mais numeroso do Brasil, segundo dados da Unesco de 2009, sendo que mais de 80% pertencem à rede pública. "O nó crítico do país é a qualidade da educação, especialmente em relação à aprendizagem", disse Maria Rebeca Otero, coordenadora de educação da Unesco no Brasil. "O aluno está na sala de aula, mas não aprende. É uma exclusão intraescolar: 22% dos alunos saem da escola sem capacidades elementares de leitura e 39% não têm conhecimentos básicos de matemática."
São investidos em Educação o equivalente a cerca de 5% do PIB, valor que o PNE, ainda a aprovar pela Câmara dos Deputados, quer dobrar para 10%. No famoso Programa Internacional de Avaliação de Alunos (PISA), divulgado no ano passado, o Brasil ficou em 55º lugar em leitura, em 58º em matemática e em 59º em ciências, num ranking de 65 países (embora tenha melhorado em relação a 2003, tendo em conta a média das três áreas).
Dois estudos mostram as tendências da profissão de professor: a pesquisa Atractividade da Carreira Docente no Brasil, da Fundação Victor Civita, revelou que só 2% dos alunos do ensino secundário queriam seguir a carreira de professor; já outra feita pela Unesco, Professores do Brasil: Impasses e desafios, mostrava que os jovens que procuram a carreira docente pertenciam a classes mais baixas e tinham estudado em escolas públicas, como Leonardo e Wládmir, e como Adriano, Cristovan e Nicole, os professores que se juntam a esta conversa de final de Janeiro.
A Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) divulgou um relatório onde o Brasil aparecia como o oitavo país com maior índice de analfabetismo num ranking de 150 países. O número de analfabetos funcionais também é alto: 27% em 2011, segundo o Observatório do Plano Nacional da Educação
As críticas feitas ao sistema dizem que os professores não são bons, que a qualidade do ensino é fraca. "É fácil culpar o professor", respondem eles. Leonardo culpa antes "a política de precarizar cada vez mais a formação e o trabalho do professor". "Fala-se que os professores são ruins. Pegar no individual é fácil, agora olhar para o sistema..."
E a precarização começa pelo salário, queixam-se: no Brasil, os professores do ensino básico ganham em média cerca de metade do salário dos profissionais com as mesmas habilitações - o que dá 18,3 reais por hora, enquanto os outros profissionais ganham 29 reais, ou seja, cerca de 5,6 e 9 euros respectivamente (dados de 2012, elaborados pela ONG Todos Pela Educação, a partir do Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE).
Leonardo, por exemplo, não sabe ainda quanto vai ganhar ao fim do mês, pois as aulas ainda não estão todas alocadas, e a escola onde foi colocado "tem um suplemento por ser considerada de difícil acesso". "No máximo dos máximos vai dar 2 mil reais (620 euros). Eu pago 550 reais (170 euros) de aluguer pela casa, mais 120 (37 euros) de condomínio. No ano passado ficava com 600-700 reais para transportes, alimentação...". Um bilhete de autocarro ou de metro custa um euro, por exemplo.
Sentado no chão da sala de Leonardo, Cristovan Ribeiro, professor de Geografia, analisa: "O principal problema é que a educação está muito atrelada à política, é ferramenta de campanha." E ser professor, diz, "é remar contra a maré": não tem o apoio da sociedade, nem da família (que aconselha a escolher uma profissão mais bem paga), "não tem o reconhecimento do estado, não tem reconhecimento muitas vezes dos alunos, não tem reconhecimento financeiro". Mais problemas que identificam: a carreira não é atractiva, os professores ficam pouco tempo nas escolas e não desenvolvem um projecto de continuidade com os alunos, falta planeamento...
No ano passado, o jornal Estado de São Paulo fez um levantamento que revelava uma debandada de professores: entre 2008 e 2012, e anualmente, cerca de 3 mil tinham abandonado as escolas públicas estaduais.
Leonardo explica a sua escolha pela escola pública. Sentado na sala, diz que se trata de "uma posição política de não aceitar a privatização do ensino e, apesar das dificuldades, tentar fortalecer o ensino público". "Investir e acreditar na educação pública no Brasil é uma tarefa política, é uma coisa que você faz porque adopta isso como estratégia para algum tipo de mudança. Pode parecer um pouco idealista, porque há vários problemas, mas ainda há professores que decidem ser professores da escola pública. Devo a minha formação à escola pública e a alguns bons professores. Então é o meu lugar de origem, é onde eu me sinto localizado." É também "uma questão de classe." 

Fonte:
http://www.publico.pt/mundo/noticia/existe-um-apartheid-educacional-no-brasil-1626450

segunda-feira, 3 de fevereiro de 2014

UM DEFEITO NA MULHER


Quando Deus fez a mulher já estava em seu sexto dia de trabalho fazendo horas extras. Um anjo apareceu e Lhe disse: “Por que leva tanto tempo nisto?” E o Senhor respondeu: “Já viu a minha ficha de especificações para ela?” “Deve ser completamente lavável, mas sem ser de plástico, ter mais de 200 peças móveis e ser capaz de funcionar com uma dieta de qualquer coisa, até sobras, ter um colo que possa acomodar quatro crianças ao mesmo tempo, ter um beijo que possa curar desde um joelho arranhado até um coração partido e fará tudo isto somente com duas mãos“.
O anjo se maravilhou com as especificações. “somente duas mãos….Impossível!” e este é somente o modelo básico? É muito trabalho para um dia… Espere até amanhã para terminá-la.”
Isso não, protestou o Senhor. Estou tão perto de terminar esta criação que é favorita de Meu próprio coração. Ela se cura sozinha quando está doente e pode trabalhar jornadas de 18 horas.” O anjo se aproximou mais e tocou a mulher.
Mas o Senhor a fez tão suave…
É suave“, disse Deus, “mas a fiz também forte. Você não tem ideia do que pode aguentar ou conseguir“. “Será capaz de pensar?” perguntou o anjo. Deus respondeu: “Não somente será capaz de pensar mas também que raciocinar e de negociar” O anjo então notou algo e estendendo a mão tocou a bochecha da mulher….. “Senhor, parece que este modelo tem um vazamento… Eu Lhe disse que estava colocando muita coisa nela…” “Isso não é nenhum vazamento… é uma lágrima” corrigiu-o o Senhor. “Para que serve a lágrima?” perguntou o anjo e Deus disse: “As lágrimas são sua maneira de expressar seu destino, sua pena, seu desengano, seu amor, sua solidão, seu sofrimento, e seu orgulho.
Isto impressionou muito ao anjo “O Senhor é um gênio, pensou em tudo. A mulher é Verdadeiramente maravilhosa” Sim é! A mulher tem forças que maravilham aos homens. Aguentam dificuldades, levam grandes cargas, mas têm felicidade, amor e alegria. Sorriem quando querem gritar. Cantam quando querem chorar.
Choram quando estão felizes e riem quando estão nervosas.
Lutam pelo que creem. Enfrentam à injustiça. Não aceitam “não” como resposta quando elas creem que há uma solução melhor. Privam-se para que a sua família possa ter. Vão ao médico com uma amiga que tem medo de ir. Amam incondicionalmente. Choram quando seus filhos triunfam e se alegram quando seus amigos ganham prêmios. Ficam felizes quando ouvem sobre um nascimento ou um casamento. Seu coração se parte quando morre uma amiga. Sofrem com a perda de um ente querido, entretanto são fortes quando pensam que já não há mais forças. Sabem que um beijo e um abraço podem ajudar a curar um coração partido. Entretanto, há um defeito na mulher: É que ela se esquece o quanto vale.

domingo, 26 de janeiro de 2014

NAMORE UMA GAROTA QUE LÊ


Namore uma garota que gasta seu dinheiro em livros, em vez de roupas. Ela também tem problemas com o espaço do armário, mas é só porque tem livros demais. Namore uma garota que tem uma lista de livros que quer ler e que possui seu cartão de biblioteca desde os doze anos.
Encontre uma garota que lê. Você sabe que ela lê porque ela sempre vai ter um livro não lido na bolsa. Ela é aquela que olha amorosamente para as prateleiras da livraria, a única que surta (ainda que em silêncio) quando encontra o livro que quer. Você está vendo uma garota estranha cheirar as páginas de um livro antigo em um sebo? Essa é a leitora. Nunca resiste a cheirar as páginas, especialmente quando ficaram amarelas.
Ela é a garota que lê enquanto espera em um Café na rua. Se você espiar sua xícara, verá que a espuma do leite ainda flutua por sobre a bebida, porque ela está absorta. Perdida em um mundo criador pelo autor. Sente-se. Se quiser ela pode vê-lo de relance, porque a maior parte das garotas que leem não gostam de ser interrompidas. Pergunte se ela está gostando do livro.
Compre para ela outra xícara de café.
Diga o que realmente pensa sobre o Murakami. Descubra se ela foi além do primeiro capítulo da Irmandade. Entenda que, se ela diz que compreendeu o Ulisses de James Joyce, é só para parecer inteligente. Pergunte se ela gosta ou gostaria de ser a Alice.
É fácil namorar uma garota que lê. Ofereça livros no aniversário dela, no Natal e em comemorações de namoro. Ofereça o dom das palavras na poesia, na música. Ofereça Neruda, Sexton Pound, cummings. Deixe que ela saiba que você entende que as palavras são amor. Entenda que ela sabe a diferença entre os livros e a realidade mas, juro por Deus, ela vai tentar fazer com que a vida se pareça um pouco como seu livro favorito. E se ela conseguir não será por sua causa.
É que ela tem que arriscar, de alguma forma.
Minta. Se ela compreender sintaxe, vai perceber a sua necessidade de mentir. Por trás das palavras existem outras coisas: motivação, valor, nuance, diálogo. E isto nunca será o fim do mundo.
Trate de desiludi-la. Porque uma garota que lê sabe que o fracasso leva sempre ao clímax. Essas garotas sabem que todas as coisas chegam ao fim. E que sempre se pode escrever uma continuação. E que você pode começar outra vez e de novo, e continuar a ser o herói. E que na vida é preciso haver um vilão ou dois.
Por que ter medo de tudo o que você não é? As garotas que leem sabem que as pessoas, tal como as personagens, evoluem. Exceto as da série Crepúsculo.
Se você encontrar uma garota que leia, é melhor mantê-la por perto. Quando encontrá-la acordada às duas da manhã, chorando e apertando um livro contra o peito, prepare uma xícara de chá e abrace-a. Você pode perdê-la por um par de horas, mas ela sempre vai voltar para você. E falará como se as personagens do livro fossem reais – até porque, durante algum tempo, são mesmo.
Você tem de se declarar a ela em um balão de ar quente. Ou durante um show de rock. Ou, casualmente, na próxima vez que ela estiver doente. Ou pelo Skype.
Você vai sorrir tanto que acabará por se perguntar por que é que o seu coração ainda não explodiu e espalhou sangue por todo o peito. Vocês escreverão a história das suas vidas, terão crianças com nomes estranhos e gostos mais estranhos ainda. Ela vai apresentar os seus filhos ao Gato do Chapéu [Cat in the Hat] e a Aslam, talvez no mesmo dia. Vão atravessar juntos os invernos de suas velhices, e ela recitará Keats, num sussurro, enquanto você sacode a neve das botas.
Namore uma garota que lê porque você merece. Merece uma garota que pode te dar a vida mais colorida que você puder imaginar. Se você só puder oferecer-lhe monotonia, horas requentadas e propostas meia-boca, então estará melhor sozinho. Mas se quiser o mundo, e outros mundos além, namore uma garota que lê.
Ou, melhor ainda, namore uma garota que escreve.


Texto original: Date a girl who reads – Rosemary Urquico
Tradução e adaptação – Gabriela Ventura